ENTREVISTA: Alan Osório

Para realizar um sonho, é preciso sempre acreditar neste sonho. Tudo é possível! Não vai ser fácil, mas se tem o objetivo de ser jogador de futebol, você vai ter que passar por muitas dificuldades e nunca desistir

Elaine Trindade

Antes de atuar pelo Braga, você era futebolista do Guimarães. Como se deu a sua transferência para o Braga?

Eu vim para a Ilha da Madeira para jogar futebol, que é a minha profissão. Ir para a Ilha da Madeira foi bom por causa do clima. Lá tem um clima mais ameno, mais parecido com o do Rio de Janeiro. Depois estive no Porto e em Guimarães. Eu vim para Braga em 2008 e estou aqui até agora. Minha vinda para Braga foi complicada, porque vim de um rival, que é o Guimarães. Eu era do Porto e aconteceu uma briga entre o Porto e o Guimarães , na época, e para ‘fazer raiva’ ao Guimarães, o Porto me emprestou para o Braga, que depois me comprou. Aí fiquei a trabalhar em definitivo para o Braga.

O português é um aficcionado por futebol e os adeptos são bastante apaixonados. Você teve receio da rivalidade quando você veio do Guimarães para o Braga?

Eu tive receio, claro, é uma rivalidade imensa . São dois clubes que estão muito perto, tipo um Vasco e Flamengo, no Rio de Janeiro. Eu pensei: ‘Estão querendo me matar!’, mas , Graças à Deus, correu tudo bem, as pessoas aqui me acolheram. Tive várias propostas para sair do clube, algumas eu mesmo recusei, outras o Presidente do clube não deixou, me segurou aqui e falou que eu ia permanecer no Braga para o resto da minha vida e é isto que está a acontecer. Não me arrependo das decisões que tomei e foi gratificante ser reconhecido pelo meu trabalho e agora estou em outro cargo.

Você chegou a anunciar a sua reforma, mas lhe foi oferecido um outro cargo no Braga. Gostava que nos contasse como é trabalhar fora de campo.

Sim, agora estou como Relações Institucionais do Braga e trabalho mais por fora. Digamos que agora sou o rosto bonito do Braga, um símbolo, que representa o clube. Para mim foi muito gratificante o jeito com que o Presidente me falou: ‘- Alan, quero que você abrace este projeto comigo, vamos criar um cargo para você e eu espero que você aceite, senão eu vou ficar triste’. Então eu dei a minha palavra e aceitei o cargo. No começo foi um pouco difícil, eu fui fazer o primeiro jogo da Liga Europa e quando eu vi os meus companheiros dentro de campo e a tocar uma música da Champions League, chegou a vir lágrima nos olhos. Foi muita emoção! Só em Braga foram 10 anos, no futebol, um total de 20 anos. Eu, praticamente, perdi essa adrenalina de estar em campo. No começo foi difícil, mas depois fui me habituando e hoje em dia já estou bem adaptado e faço o elo de ligação entre os jogadores e o Presidente. Faço uma aproximação com os outros Diretores. Estou sempre com os jogadores, converso com eles, faço às vezes de psicólogo também, dou uns conselhos, às vezes uns puxões de orelha e é baseado nisso que a minha profissão vai se encaminhando.

Ainda está a fazer campanhas?

Faço parte de várias campanhas em que o Braga entra, vou também em corridas solidárias de vários tipos e agora abracei uma causa que é uma instituição da qual sou padrinho em Ruilhe, Padre David, e tento ajudar as pessoas da melhor maneira possível. Às vezes com uma palavra, um gesto.

Para você, quais são as principais diferenças do futebol no Brasil e o futebol na Europa?

A diferença é que o futebol brasileiro é muito mais lento que aqui, a grama é mais alta e o clima ajuda muito ao futebol se tornar mais lento. Aqui, na Europa, é muito mais rápido e tem o fator frio. Muitos jogadores não conseguem se adaptar. O pé congela! Quem tem muita sensibilidade ao frio não consegue. Muitos jogadores brasileiros vêm para a Europa e não se adaptam. Aqui em Portugal ainda é um país que tem frio, mas nem tanto. Aqui é mil maravilhas. O clima não é tão frio, a comida é boa e as pessoas ainda falam uma língua parecida com a nossa. Apesar de falar Português, quando a gente chega é um pouco difícil de entender. Eu quando cheguei na Madeira fiquei um tanto perdido, a fala é muito mais carregada.

No Brasil você jogou em alguns clubes, chegou a ir para o Cruzeiro, em Minas Gerais. Como foi a experiência?

Eu jogava no Ipatinga, na época do Itair Machado. Eu era do time da Universal do Rio de Janeiro e fui emprestado para o Cruzeiro na época, mas eu nem cheguei a jogar pelo Cruzeiro. Me mandaram para o Ipatinga, que era uma espécie de filial. Depois, fiz a Copa João Havelange e o Ipatinga esteve muito bem, disputei o Campeonato Mineiro e vim logo para cá. Foi tudo muito rápido! No Rio de Janeiro eu joguei futsal até os 16 anos, só depois fui para o campo. Em 3, 4 anos de campo eu vim para a Europa, então foi bem rápido.

No Brasil dizem que os jogadores são muito franzinos e costumam ganhar mais massa muscular depois que vêm para a Europa. É verdade?

Eu era muito franzino e procurei o futsal porque eu era muito magrelinho e tinha que crescer. Fui a vários clubes e recebi vários nãos (sic) por causa disso. Era pequenino e franzino. Teve até uma história engraçada: no Vasco me deixaram por 6 meses. Eu ia sempre e pediam: ‘volta daqui a 3 meses’ e eu voltava. Até que um dia, eles disseram: ‘Não tem jeito, você não cresce’. Aí eu disse: ‘mas, meu pai é grande, meu irmão é grande’. Levei meu irmão e meu pai lá. Meu irmão tem 1,93m de altura e meu pai tem 1,87m. E, eles disseram que meu irmão tinha me tirado tudo. Eu acho que eles queriam um jogador de basquete (risos). Daí continuei no futsal, fui para Minas jogar no campo e vim para Portugal.

Você tinha 19 anos quando veio para Portugal. Como foi ficar longe da família e dos amigos mesmo tão novo?

Foi assustador! Para sair do país comecei a chorar. Foi muita angústia! Eu tinha 19 para 20 anos, estava sozinho e aí meu pai falou que eu não podia desistir. Que o sonho de todo jogador era ir para a Europa. Ele disse: ‘– Você vai. Nem que eu te prenda na cadeira do avião, mas você vai’. Nos primeiros meses eu chorava muito de saudade. Teve uma folga no Natal, de três dias, e eu fui ao Brasil e voltei só para passar o Natal com minha família, de tanta saudade. Agora, já tem seis anos que não vou ao Brasil. Meus filhos nasceram aqui, um na Madeira e um no Porto. Minha esposa é de cá. É de Viseu. Ela é professora e a conheci na Ilha da Madeira.

E sua família do Brasil, veio para cá?

Ainda não. Mas eles nos visitam. Sempre estão por cá. Estou a tentar convencer o meu irmão a vir para cá também. Ele gosta muito do Rio de Janeiro, mas como está a ficar cada vez mais difícil a vida lá, ele está a pensar na hipótese.

O que você ama em Braga?

Eu também fiquei em Braga porque fui muito bem acolhido e criei raízes aqui. Como não saí daqui para jogar em outro lado, já estou como se tivesse nascido em Braga. As pessoas já me veem como se eu fosse da cidade mesmo e para mim não há coisa melhor do que esse carinho. A palavra é gratidão. Sou muito grato a eles por tudo que fazem por mim até hoje. Braga é muito acolhedora e não é só com os brasileiros. Por isso que Braga tem crescido muito, já tem até trânsito de cidade grande (risos).

Quem ama mais o futebol? O português ou o brasileiro?

Não é que aqui seja maior. O país é menor e está voltado para o futebol. Os outros desportos não têm o mesmo destaque, então os portugueses ficam muito mais ligados ao futebol. Mas gostam tanto quanto os brasileiros. No Brasil tem o Voleibol, o automobilismo, o ciclismo e aqui é mais o futebol. É claro que tem excelentes profissionais em outras áreas como no atletismo, no futsal, na canoagem, no futebol de praia em que o Braga foi campeão do mundo, duas vezes campeão europeu e três vezes campeão nacional. Isso em 6 anos.

Como o Braga recebeu a convocação do Dyego Sousa para compor a seleção de Portugal? Já era esperado?

Eu tinha falado com ele que ele estava numa fase muito boa e que mesmo ficando de fora algumas vezes podia ser chamado. Ele estava muito ansioso e me pediram para conversar com ele algumas vezes. Chamei-o ao meu gabinete para saber o que se passava e ele estava chateado porque nem sempre o treinador o colocava para jogar, mas o contrato não diz que o treinador tem de colocar o jogador para jogar e temos que respeitar a opção do treinador. Eu disse a ele: ‘Faz o teu trabalho e quem sabe você tenha uma surpresa’. Eu falei com ele: ‘Olha que tu podes ir para a seleção!’, mas ele não acreditou no que eu falei. O adjunto do selecionador já tinha estado no Braga e eu o conheço bem. Sempre a acompanhar os jogos do Braga e eu tentava puxar, né? ‘E, aí? Vai levar o meu menino?’. Trabalhou e conseguiu! A sorte se procura também. Ele ficou muito contente. Ele já está aqui há muito tempo também. Para mim não foi surpresa. Eu já estava a espera dele ir para a seleção. Fiquei surpreso, claro! Um jogador do Braga chamado a integrar a Seleção é uma felicidade. Há um tempo atrás seria algo impensável. Isso prova que o Braga está entre os grandes clubes de Portugal.

Tem algum projeto a ser desenvolvido pelo Braga neste momento?

Temos o projeto de acabar a academia e agora vai ser a parte da equipe principal. O Centro de Treinamento está espetacular. Para os jogadores vai ser uma maravilha ter ali mesmo onde descansar depois do treino. Será possível fazer a pré-temporada aqui mesmo e isso vai facilitar muito. Os jogadores não vão precisar de deslocações.  Vão ter um tempo maior de descanso. Uma alimentação melhor.

Como está a escolinha de futebol do Braga? Há muitos brasileiros lá?

Nós temos 330 a 360 crianças em nossa escolinha e vemos o público brasileiro aumentar. Já são muitos meninos brasileiros na escolinha agora. Como o Braga cresceu rapidamente nestes últimos anos, os miúdos já vão vendo o Braga com outros olhos. Veem o Braga e querem dizer: ‘Eu sou Braga!’

Gostava que mandasse um recado aos miúdos brasileiros que sonham em seguir na carreira de futebolista.

Para realizar um sonho, é preciso sempre acreditar neste sonho. Tudo é possível! Não vai ser fácil, mas se tem o objetivo de ser jogador de futebol, você vai ter que passar por muitas dificuldades e nunca desistir. Isso é certo em qualquer profissão. É preciso estar focado no que é preciso fazer. O mais importante é fazer com alegria. Se eu quero ser jogador de futebol tenho que meter na cabeça: vou sofrer? Vou, mas eu quero trabalhar para alcançar meu sonho. Lute pelos seus sonhos e divirta-se, porque no final poderá dizer ao menos que tentou e fez tudo que podia ter feito. Mesmo que não consiga, tentou e foi feliz.

Jornal Olhar

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