Será que toda mulher gosta de receber uma cantada (pirobo) de um desconhecido?
A opção pelo tema se justifica quando se considera a situação das vítimas expostas ao assédio, à violência explícita ou subreptícia não é nova e merece atenção cada vez mais atenta.
O tema ganha destaque quando analisamos os números: 16 feminicídios em Portugal em 2019.
O abuso sexual foi reconhecido como um problema social no início dos anos 80 e uma grande polêmica e confusões ocorreu com o conceito de assédio sexual diante do movimento # Me too iniciado nos Estados Unidos, no final de 2017, no qual as vítimas de assédio sexual partilham nas redes sociais histórias pessoais de assédio sexual e, em contrapartida, criou-se um manifesto na França, denunciando o puritanismo da campanha americana, defendendo o direito à liberdade de importunar, algo que é vital para a liberdade sexual.
Trata-se de enorme violência, independentemente de uso de força física ou moral para obter a sua consumação, uma vez que não se coaduna com o pressuposto de igualdade de direitos entre homens e mulheres e com a aceitação da liberdade sexual da mulher, nomeadamente, sua faculdade de consentir (ou não) com relacionamento sexual.
A liberdade sexual pode ser conceituada como o direito de disposição do próprio corpo, ou de não ser forçado a praticar ato sexual, totalmente contrário da aludida liberdade de importunar. É natural e deve ser exigido o respeito à vontade do sexo oposto, estabelecendo cada qual seus próprios limites para a importunação do outro.
Seja no trabalho, na rua ou mesmo na vizinhança, o assédio sexual é um comportamento não aceitável e precisa ser extirpado.
Nos crimes sexuais a apresentação de provas dificulta a defesa da vítima, pois é subjetiva e difícil de se obter. Para superar esse dilema o ideal é que a vítima, no dia do ocorrido ou, no máximo, no dia seguinte ao evento, ao ter a requisição da polícia para fazer o laudo médico, no Instituto de Medicina Legal ou nos gabinetes médico-legais, verificar a presença de sémen dentro do canal vaginal.
Diante disso, a palavra da vítima deveria ser levada em alta consideração, o que não ocorre em muitos casos de crimes sexuais, o que justifica a existência de tantos casos de vítimas silenciosas.
Trazendo esses fundamentos à análise do problema em tela, é premente sublinhar que o crime sexual é cometido dentro de quatro paredes e, muitas vezes, não deixa vestígios; trata-se da palavra da vítima contra a do agressor.
Diante disso, a condenação criminal e cível do agressor é difícil, embora não seja motivo para desestimular a denúncia dessa nova forma de violência contra a mulher.
Como perspectiva de enfrentamento, é necessário que as vítimas denunciem os repugnantes crimes, para punição dos agressores e ajudar para a construção da cultura dos direitos humanos na relação interpessoal.
Como em outras circunstâncias dessa ordem e na visão preventiva, é fundamental sensibilizar a comunidade para a importância de exercer papel ativo na denúncia e desenvolvimento do processo-crime, para assegurar a dignidade da pessoa humana e prestação jurisdicional justa e eficaz. Na mesma ordem de raciocínio, é imprescindível desenvolver atividades educativas para que jovens tenham consciência de seu direito ao corpo e ao desenvolvimento da sexualidade, sem a imposição ou a coação de terceiros.
Helena do Passo Neves
Advogada