Começou invernoso este verão, não arrefecendo contudo o otimismo popular. Portugal vive hoje uma euforia, fruto de fatores racionais e afetivos. Todos eles contam e podemos enumerar alguns deles: 1) as vitórias desportivas, em especial da Seleção Portuguesa na Liga das Nações da UEFA; 2) Os prémios repetidos que o turismo português recebe; 3) a baixa histórica das taxas de juros; 4) as benesses concedidas aos cidadãos em ano de eleições; 5) o aumento do crédito ao consumo; 6) A continuação da entrada de investidores e imigrantes; 6) Um cenário mediático favorável.
Estes e outros fatores, levam a um otimismo superficial. Na verdade, ninguém nem mesmo no Governo, pode asseverar que o crescimento é sólido e que os problemas económicos estão sob controlo. Pelo contrário, a dívida pública aumenta, o endividamento externo aumenta, e o cenário só está mais controlado porque temos um competente Ministro das Finanças. Que foi meu colega, e aprendeu como eu, como se controlam Finanças Públicas. Hoje, aprovam-se orçamentos de estado generosos e otimistas, para agradar politicamente a quem os aprova, mas depois a despesa fica cativada à ordem do Senhor Ministro das Finanças, que a retém ou corta. Estes cortes de Centeno não são diferentes dos cortes de Ferreira Leite ou de Gaspar, mas a forma como são comunicados ou como os media os tratam, é que é diferente.
No setor privado há empresas em forte crescendo que são as exportadoras, as tecnológicas ou turísticas. Esta em especial reboca um setor que estava desparecido há uma década, o do imobiliário e construção. E a subida de preços de mercado dos imóveis alimenta egos e especulação, mais do que deveria.
Os salários pouco subiram e o desemprego continua a descer. Por quê? Porque os mais qualificados continuam a emigrar e porque no Verão há sempre mais emprego devido ao turismo.
O turismo tornou-se aliás fonte importante de receita para muitas famílias. Dezenas de milhares de famílias viram os seus rendimentos aumentados com a exploração do Alojamento Local, e com negócios montados para responder à procura elevada de Portugal por turistas.
E perante esta alegre aquarela do país, onde residem as inquietações? Aos realistas, ou “pessimistas” e “céticos” como chamam a quem vê lá mais à frente, levantam-se nuvens no horizonte a que convém estar atento. Analisemos algumas delas. As taxas de juros, hoje negativas na Europa não ficarão para sempre assim. O crescimento económico de Europa (lento) e EUA (forte) terá uma inversão de ciclo. O continuado aumento da carga fiscal em Portugal, continuará a incentivar investimentos noutros países. E a bonança e o estado de graça de Portugal no mundo, não durarão para sempre.
Numa época em que é visível a insuficiência dos serviços públicos para darem respostas aos cidadãos, e quando se antevê um forte aumento da despesa com novas contratações, já anunciadas pelo Primeiro Ministro caso ganhe as eleições, existem razões para perceber que o aumento de despesa que virá no médio prazo é preocupante. No curto prazo, contará o otimismo, dinheiro e oportunidades para aqueles que tenham a sorte de serem recrutados para esse sólido empregador chamado Estado Português. Renderá popularidade e votos em Outubro e sorrisos até final do ano.
Só que o crescimento do turismo e dos investidores tem limites, e pode ter regressão. Sem afluxo de dinheiro de fora, o tímido crescimento desaparecerá. E para pagar novos funcionários, a despesa e carga fiscal terão que aumentar. Ocorrendo este cenário, a recessão, a dívida, a subida dos juros, trará de volta a palavra proibida, “austeridade”. E quem sabe outra vez o FMI, parceiro de 3 bancarrotas em 40 anos de democracia.
Para evitar este cenário, seriam precisas grandes reformas, fiscais, burocráticas e de cidadania. Apesar de reconhecer no atual Governo pela política realista quanto à imigração e quanto à vontade de facilitar a livre circulação nos países de língua portuguesa, é preciso pensar um pouco mais à frente. É que se a Alemanha se constipa, Portugal entra em gripe. A gripe longa deriva numa pandemia como a crise que nos trouxe o FMI em 2011. E se essa fatalidade ocorrer, que fará Portugal às centenas de milhares de imigrantes que vai acolhendo? Aos tugas originários, bastará enfrentar mais uma crise e mais uma falência do país, aguentar ou emigrar. Mas e com os outros, o que ocorrerá? Não há segurança social que segure tantos imigrantes.
Portugal só tem um caminho, que é reformar, cortar taxas, baixar impostos, eliminar burocracia, ser competitivo. Sei que estes alertas não geram sorrisos, não vendem jornais, não são convenientes. Mas para manter a galinha dos ovos de ouro que são os investidores, os turistas e os emigrantes qualificados, Governo Central e Câmaras, deveriam apostar menos em publicidade e nos media, e mais em ações concretas. É que as Câmaras não estão isentas, nomeadamente pelos entraves à construção e aos licenciamentos. Como se podem atrair mais pessoas e empresas se a burocracia as limita administrativamente? Quase como se disséssemos ao mundo: “esperem lá, não venham tantos…. que nós precisamos de tempo para as nossas regrinhas”. Ou com o otimismo ilusório tem convencido os portugueses de que podem ter tudo, e é tudo compatível: viver em verdadeiros parques naturais protegidos, e, crescer de forma a não serem os pobres da Europa!
A bonança que vivemos depende muito mais da conjuntura internacional do que do país. Não queiramos matar a galinha com ganância de ter tudo e de ganhar tudo agora. Até final de 2019, os festejos estão garantidos. Mas, e depois, alguém sabe o que 2020 nos trará?
Joaquim Álvaro da Rocha R. da Cunha
Economista e Administrador